Bêbado Louco...
“Olha aí a Cabelinha!”. Esta frase ouvi umas tantas vezes entre minha infância e adolescência. Uma frase que parece não fazer sentido nenhum; contudo, pra quem conheceu o "Bom Cabelo", sabia que era um cumprimento.
O "Bom Cabelo" era um senhor que vivia sentado num banquinho à porta do Empório Santa Filomena, tomando o seu goró diário. Recebeu este apelido dos moradores da nossa rua, pois cumprimentava a todos que passavam com a sua saudação bem peculiar e que, durante os anos, foi sua marca registrada. Se tornou tão familiar pra nós que nunca nos perguntamos o porquê de chamar a quem quer que fosse de cabelinha(o).
E assim fazia de manhã, à tarde e à noite, repetindo com a mesma entonação: “Bom dia, Cabelinha(o)”. Diziam que começou a beber quando, na vida de caminhoneiro, entrou num acidente numa das estradas de São Paulo, no qual houve uma fatalidade. E assim, se sentindo culpado e com remorso por causar a morte de alguém, nunca mais quis dirigir ou trabalhar e iniciou-se na vida de bebum.
Nos poucos momentos de sobriedade, ajudava as pessoas no que precisassem, em troca de um prato de comida. Carregava sacolas, limpava algum quintal, varria calçadas, enfim, algumas pequenas tarefas de quem o requisitasse. Outras tantas vezes, simplesmente batia nos portões da vizinhança, mal se segurando nas próprias pernas, e caía sentado, esperando até que aparecesse alguém que lhe desse comida e uma mãozinha pra voltar para a porta do bar.
Por mais estranho e inusitado que possa ser, este personagem ali da Leonor Barbosa, no bairro do Limão, fez parte da vida de muita gente, pois não havia quem não comentasse a respeito dele nas suas conversas diárias. Nas raras vezes em que não aparecia na hora em que costumávamos vê-lo - ou seja, logo quando abria a mercearia, sentado no seu lugar cativo -, todos já começavam a perguntar onde estaria o "Bom Cabelo". Um pouco mais tarde aparecia ele dizendo: "Hoje dormi até mais tarde". E lá ia ele sentar na porta do bar do "Seu Pasqual" e logo emendava: "Me vê aí uma da boa".
E assim passava os seus dias entre goles, causos, cumprimentos e pequenos afazeres. Soube que morreu há poucos anos.
Existem personagens que ficam marcados na nossa memória sem precisarem fazer nada, apenas estando ali no nosso cotidiano, como uma peça importante do cenário da nossa infância. O nosso bairro não seria o mesmo sem estas figuras: loucos, bêbados, pedintes e tantos outros personagens que supostamente estão à margem da sociedade, mas que, quando somos crianças, completam o quebra-cabeça que é a nossa vida.
Aposto que todo mundo se lembra de um!
Posted on quinta-feira, junho 25, 2009 by Anônimo and filed under
Histórias de Bêbados
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O "Bom Cabelo" era um senhor que vivia sentado num banquinho à porta do Empório Santa Filomena, tomando o seu goró diário. Recebeu este apelido dos moradores da nossa rua, pois cumprimentava a todos que passavam com a sua saudação bem peculiar e que, durante os anos, foi sua marca registrada. Se tornou tão familiar pra nós que nunca nos perguntamos o porquê de chamar a quem quer que fosse de cabelinha(o).
E assim fazia de manhã, à tarde e à noite, repetindo com a mesma entonação: “Bom dia, Cabelinha(o)”. Diziam que começou a beber quando, na vida de caminhoneiro, entrou num acidente numa das estradas de São Paulo, no qual houve uma fatalidade. E assim, se sentindo culpado e com remorso por causar a morte de alguém, nunca mais quis dirigir ou trabalhar e iniciou-se na vida de bebum.
Nos poucos momentos de sobriedade, ajudava as pessoas no que precisassem, em troca de um prato de comida. Carregava sacolas, limpava algum quintal, varria calçadas, enfim, algumas pequenas tarefas de quem o requisitasse. Outras tantas vezes, simplesmente batia nos portões da vizinhança, mal se segurando nas próprias pernas, e caía sentado, esperando até que aparecesse alguém que lhe desse comida e uma mãozinha pra voltar para a porta do bar.
Por mais estranho e inusitado que possa ser, este personagem ali da Leonor Barbosa, no bairro do Limão, fez parte da vida de muita gente, pois não havia quem não comentasse a respeito dele nas suas conversas diárias. Nas raras vezes em que não aparecia na hora em que costumávamos vê-lo - ou seja, logo quando abria a mercearia, sentado no seu lugar cativo -, todos já começavam a perguntar onde estaria o "Bom Cabelo". Um pouco mais tarde aparecia ele dizendo: "Hoje dormi até mais tarde". E lá ia ele sentar na porta do bar do "Seu Pasqual" e logo emendava: "Me vê aí uma da boa".
E assim passava os seus dias entre goles, causos, cumprimentos e pequenos afazeres. Soube que morreu há poucos anos.
Existem personagens que ficam marcados na nossa memória sem precisarem fazer nada, apenas estando ali no nosso cotidiano, como uma peça importante do cenário da nossa infância. O nosso bairro não seria o mesmo sem estas figuras: loucos, bêbados, pedintes e tantos outros personagens que supostamente estão à margem da sociedade, mas que, quando somos crianças, completam o quebra-cabeça que é a nossa vida.
Aposto que todo mundo se lembra de um!
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